Especialistas alertam que exposição ao coronavírus, por meio de vacinação ou infecção, não significa que você esteja completamente protegido
Se você é um dos milhões de brasileiros que já tiveram Covid-19, pode estar se perguntando por quanto tempo terá imunidade ao coronavírus. No início da pandemia, a maioria das pessoas assumiu que ser infectado tinha pelo menos uma vantagem: que você estaria protegido contra futuros contatos com o vírus. Mas, à medida que uma quarta onda se desenha no país e oSARS-Cov-2 não mostra sinais de abrandamento, as reinfecções parecem ter se tornado comuns. Muitas pessoas já estão relatando segundas ou até terceiras infecções com variantes mais recentes.
Especialistas alertaram que a exposição ao coronavírus — por meio de vacinação ou infecção — não significa que você esteja completamente protegido. Em vez disso, o coronavírus está evoluindo para se comportar mais como os vírus que causam resfriados comuns e infectam as pessoas repetidamente ao longo de suas vidas.
“Pensei, quase desde o início desta pandemia, que a Covid-19 acabaria se tornando uma infecção inevitável que todo mundo pega várias vezes, porque é assim que um novo vírus respiratório se estabelece na população humana”, disse Amesh Adalja, especialista em doenças infecciosas da Universidade Johns Hopkins, no Reino Unido.
No entanto, o coronavírus ainda não se encaixa em padrões sazonais claros, como os outros vírus comuns do resfriado. Também pode causar sintomas debilitantes que persistem por meses ou anos em algumas pessoas e já ceifou a vida de milhões de outras. Então, o que você pode fazer para se proteger, não apenas da infecção, mas também da reinfecção? Pedimos a especialistas respostas para perguntas comuns.
Quanto tempo durará minha imunidade depois de pegar a Covid?
Antes da Ômicron, as reinfecções eram raras. Uma equipe de cientistas, liderada por Laith Abu-Raddad, da Weill Cornell Medicine-Qatar, estimou que uma contaminação com Delta ou uma cepa anterior de coronavírus foi cerca de 90% eficaz na prevenção de uma reinfecção em pessoas vacinadas e não vacinadas. Porém, “a Ômicron realmente mudou esse cenário”, disse Abu-Raddad, epidemiologista de doenças infecciosas.
Depois que a Ômicron surgiu, as infecções anteriores forneceram apenas cerca de 50% de proteção contra a reinfecção, mostrou o estudo de Abu-Raddad. O coronavírus adquiriu tantas mutações em sua proteína spike que as versões mais recentes se tornaram mais transmissíveis e mais capazes de escapar da imunidade. Isso significa que você pode pegar uma versão da Ômicron depois de se recuperar de uma variante mais antiga, não Ômicron. Você pode até ficar doente com uma das subvariantes mais recentes da Ômicron depois de superar uma versão diferente dela.
Outros fatores também aumentam a vulnerabilidade à reinfecção, começando com quanto tempo se passou desde que você teve Covid. As defesas imunológicas tendem a diminuir após uma infecção. Um estudo publicado em outubro de 2021 estimou que a reinfecção poderia ocorrer em até três meses após contrair a Covid-19. Embora essas descobertas se baseassem no genoma do coronavírus e representassem declínios esperados nos anticorpos que poderiam combater o vírus, o estudo não levou em conta novas variantes como a Ômicron, que eram radicalmente diferentes das variantes mais antigas.
Devido às especificidades da Ômicron, a proteção pode diminuir ainda mais cedo. Em um estudo publicado em fevereiro que ainda não foi revisado por pares, cientistas da Dinamarca descobriram que algumas pessoas foram reinfectadas com a sublinhagem BA.2 de Ômicron apenas 20 dias após terem sido infectadas com a Ômicron BA.1 original.
Como o vírus está infectando mais pessoas agora, as chances de ser exposto e reinfectado também são maiores, disse Abu-Raddad. E embora não esteja claro se algumas pessoas são simplesmente mais suscetíveis à reinfecção da Covid-19, os pesquisadores estão começando a encontrar algumas pistas. Pessoas mais velhas ou imunocomprometidas podem produzir muito poucos anticorpos ou de muito baixa qualidade, deixando-as mais vulneráveis à reinfecção, informou o especialista.
Pesquisas iniciais também mostram que um pequeno grupo de pessoas tem uma falha genética que paralisa uma molécula imunológica crucial chamada interferon tipo I, colocando-as em maior risco de sintomas graves de Covid. Ainda são necessários outros estudos para saber se essas diferenças também desempenham um papel na reinfecção.
Por enquanto, você deve tratar quaisquer novos sintomas, incluindo febre, dor de garganta, coriza ou alteração no paladar ou olfato, como um possível caso de Covid, e fazer o teste para confirmar se deu positivo novamente.
As infecções subsequentes serão mais ou menos graves?
A boa notícia é que seu corpo pode contar com células imunológicas, como células T e células B, para anular uma reinfecção se o vírus passar pelas suas defesas iniciais de anticorpos. As células T e as células B podem levar alguns dias para serem ativadas e começarem a funcionar, mas tendem a se lembrar de como combater o vírus com base em encontros anteriores.
“Seu sistema imunológico tem todos os tipos de armas para tentar conter o vírus”, comentou Shane Crotty, virologista do Instituto La Jolla de Imunologia, na Califórnia.
Muitas dessas células imunes constroem suas proteções de forma iterativa, disse Crotty. Isso significa que as pessoas vacinadas e reforçadas estão especialmente bem equipadas para combater o coronavírus. Da mesma forma, as pessoas que foram infectadas antes são capazes de impedir que o vírus se replique em altos níveis se forem reinfectadas. E a maioria das pessoas que já tiveram Covid e foram vacinadas desenvolvem uma imunidade híbrida que pode oferecer a melhor proteção. O resultado é que a segunda ou terceira infecções provavelmente serão mais curtas e menos graves.
Abu-Raddad, que acompanha reinfecções entre grandes grupos de pessoas no Catar, já começou a ver esse padrão promissor nos registros de pacientes: das mais de 1.300 reinfecções que sua equipe identificou desde o início da pandemia até maio de 2021, nenhuma levou à hospitalização em uma UTI, e nenhuma foi fatal.
Mas só porque as reinfecções são menos graves, isso não significa que elas não sejam terríveis. Você ainda pode ter febre e sentir dores no corpo, confusão mental e outros sintomas. E não há como saber se seus sintomas persistirão e se tornarão Covid longa, disse Adalja.
É possível que cada infecção por Covid se manifeste de uma forma distinta, embora alguns pesquisadores suponham que o risco seja maior logo após a primeira contaminação. Um dos fatores de risco para a Covid longa é ter altos níveis de vírus em seu sistema no início de uma infecção, e é provável que você tenha uma carga viral tão alta na primeira vez que for infectado, de acordo com Abu-Raddad. Em infecções subsequentes, seu corpo estará melhor preparado para combater o coronavírus, para que você possa manter o vírus em níveis baixos até que seja completamente eliminado, disse ele.
O que você pode fazer para reduzir o risco de reinfecção?
Segundo Abu-Raddad, “não há solução mágica contra a reinfecção por Covid”. Mas muitas das ferramentas e comportamentos que ajudam a proteger contra a infecção ainda podem servir depois que você tiver Covid-19 pela primeira vez.
Você só precisa esperar algumas semanas após uma infecção para se vacinar. As vacinas aumentarão seus níveis de anticorpos, e pesquisas mostram que elas são eficazes na prevenção de resultados graves se você adoecer novamente.
“A confiança científica na imunidade induzida pela vacina foi e é muito maior do que a imunidade induzida pela infecção”, comentou Crotty.
Medidas adicionais, como usar máscara dentro de casa e em aglomerações, distanciamento social e melhorar a ventilação dos espaços sempre que possível, podem fornecer outra camada de proteção. Mas, como a maioria das pessoas e comunidades abandonou amplamente essas medidas, cabe aos indivíduos decidir quando tomar precauções extras com base no risco de contrair a Covid e no quanto gostariam de evitá-la.
“Se você teve uma infecção na semana passada, provavelmente não precisará de máscara”, explicou Adalja. “Mas depois de um mês ou mais de sua infecção e à medida que novas variantes começam a circular, pode fazer sentido. Pessoas que estão tentando evitar a Covid porque vão viajar em breve ou porque precisam de um teste PCR negativo por algum outro motivo podem considerar essas precauções, que não precisam ser sempre as mesmas”.
Por Agência O Globo